O CAPUT surge em Belo Horizonte em um momento em que ainda não
existe uma política pública específica para esse segmento segregado da
população ‒ o jovem pobre, negro, com laços familiares esgarçados, e ligado ao
tráfico de drogas ‒, de quem ninguém parece querer saber.
No
modelo adotado pelo CAPUT, o indivíduo desempenha o papel de agente ativo, e a
interação droga-usuário é o alvo simplesmente de uma observação, o que o
diferencia do modelo
das comunidades terapêuticas ou do modelo médico, para os quais a droga é o
ponto principal, o agente
gerador de dependência, e a genética e o meio-ambiente, os responsáveis pela
“doença”. Os aconselhamentos educativos baseados no uso da autoridade racional e
os grupos de mútua-ajuda focados na abstinência, associados a uma terapêutica
centrada no psicofármaco, são, basicamente, as intervenções oferecidas nesses
modelos, baseadas, em alguma medida, em abordagens morais.
Para
o CAPUT, pelo contrário, o uso da droga é visto como um comportamento que
persistirá enquanto desempenhar uma função para o indivíduo. O que interessa à
equipe, na construção de cada caso clínico, é o arranjo dos elementos do
discurso do sujeito ‒ nos quais se incluem os atos do adolescente, entendendo
que também são norteados por uma determinada posição no discurso ‒, que aparecem
em cada atendimento psicanalítico e psiquiátrico, em cada atividade de
expressão e sociabilização, no cotidiano da instituição. São “encontros vivos”
para discussão dos temas prementes da adolescência (amor, sexualidade,
autoridade parental, identidade, autonomia, reconhecimento, transformação,
profissão, criminalidade, discriminação racial, projeto de vida), além de um trabalho
delicado e essencial com o corpo, objeto privilegiado pelo adolescente ‒ em
fase exatamente de mudanças biológicas e pulsionais ‒, tanto nas atuações em busca de prazer,
quanto como palco sintomático dos conflitos que surgem na reconfiguração do eu.
O CAPUT tem um modo próprio de lidar com as contradições
e a violência da sociedade, sem segregar. Elegemos o "abuso de
drogas" para oferecer ao adolescente uma proposta de interrogação. O sintoma sempre é um indicativo do
insuportável. Convidar à investigação do sintoma é uma aposta no sujeito, para
que este ‒ cada um ‒ assuma a tarefa de
construir seu próprio destino, na particularidade de sua história. Singularmente.
Nossa estratégia para marcar esse encontro do adolescente
com seu inconsciente? O vínculo de amor com as pessoas que cuidam dele e com a
casa que o acolhe. Vínculo fundamental, descrito por Freud, que
possibilita que o sujeito possa supor, em seu sintoma, um saber sobre si. Tentando substituir o traficante,
que acaba ocupando um lugar de suplência para esses adolescentes, também lhe oferecemos
objetos, o analista e a oficina de arte, mas com escuta, e com respeito às
invenções de cada um. Com hora marcada. A hora certa, prévia à agenda com a
morte que lhes parece destinada. A hora possível do advento de um sujeito.
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